Quase todos os aspetos do quotidiano no país acabaram por ser afetados pela crise política que nasceu no seio do Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), vencedor incontestado das eleições gerais de 2014, mas após um congresso interno em que já se notavam as divisões.
O Presidente da República, José Mário Vaz, demitiu o primeiro-ministro (e presidente do partido) Domingos Simões Pereira em agosto de 2015 e desde então não voltou a haver um governo que conseguisse pôr o parlamento a funcionar.
Mas estabilidade, nem vê-la.
O ano de 2016 foi um prolongamento da crise política semeada em 2014 e colhida em 2015, agora com crispações pessoais e políticas a chegarem ao rubro, relegando para segundo plano a grave situação social do país.
As escolas públicas estiveram fechadas durante quase todo o primeiro período devido a uma greve geral de professores, houve deterioração de equipamentos e serviços de saúde, suspensão de projetos de novas infraestruturas rodoviárias e a atividade legislativa paralisou.
Até no futebol, que os guineenses tanto amam, o campeonato foi interrompido a meio devido a alegada falta de verbas a atribuir pelo governo.
A Liga Guineense dos Direitos Humanos lançou um alerta no início de dezembro: a crise tem levado a que o país deixe de contar com políticas públicas devido a «ausência de um governo legítimo» para as elaborar.
É um regresso à estaca zero do país em que nunca um governo cumpriu o respetivo mandato até ao fim.
Por outro lado, com a instabilidade há menos controlo do erário público e a Liga refere que a corrupção têm crescido no aparelho de Estado.
O Presidente Vaz e o PAIGC aprofundaram o fosso que os separa, com o chefe de Estado a demitir o veterano Carlos Correia (segundo primeiro-ministro da legislatura) e dar posse a um governo formado pelo principal partido da oposição (PRS) e 15 deputados dissidentes do PAIGC.
Mas sem o controlo da comissão permanente da Assembleia Nacional Popular (nas mãos do PAIGC), esta nova maioria parlamentar nunca conseguiu por o hemiciclo a funcionar e o seu governo acabou por cair.
O terceiro primeiro-ministro do ano foi Umaro Sissoco, general na reserva aos 44 anos, figura desconhecida das lides políticas e que não gerou consenso junto dos partidos – apesar de resultar do Acordo de Conacri, mediado pela Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) para resolver a crise.
Nas ruas houve manifestações organizadas que juntaram cerca de mil pessoas a pedir a renúncia do Presidente da República, José Mário Vaz, mas acabaram por ser proibidas e até reprimidas pelo Governo da «nova maioria», no que foi considerado pela Liga dos Direitos Humanos como um sinal de retrocesso no domínio das liberdades.
A organização chegou a falar da tentativa de impor um novo regime, com censura na Rádio Difusão Nacional e na Televisão da Guiné-Bissau, com o objetivo de silenciar a população.
Só o golo do guineense Éder que fez de Portugal o novo campeão europeu de futebol e a apuramento da Guiné-Bissau para o Campeonato Africano das Nações (CAN) parece salvarem o ano – resta saber se a seleção terá verbas para participar na prova a partir de 14 de janeiro, no Gabão.